sábado, 23 de fevereiro de 2013

Ilusion

http://www.youtube.com/watch?v=CNydZwMduN8
("Ilusion" - Marisa Monte e Julieta Venegas)




À primeira vista parecia o céu. De um azul profundo, nuvens esparsas, imensidão. Olho para baixo contemplo a vista. Embevecido, entorpecido. Como muitas e muitas vezes antes, penso em mergulhar de cabeça. Penso em fechar os olhos e me atirar. Penso em seguir meu primeiro impulso, dar-me um pequeno impulso, e pronto. Braços abertos, peito aberto, coração aberto. Sem medo, sem pestanejar.


O céu refletido na água impressiona. Como um espelho, liso, perfeito. Convidativo. Chamando-me, chamando-me, chamando-me. Seduzindo. Implorando. Perturbando. Olho mais uma vez para baixo. Penso em seguir. Todo o meu corpo, todo o meu ser clama por esse mergulho. Cada fibra de mim, cada célula, cada neurônio. Inebriado, nem penso em resistir. Resistir pra quê? Afinal, a vida é curta e temos que aproveitar. Cada momento é único, temos que vivê-los intensamente.

Ir ou não ir, eis a questão. Saltar, e não pular, como bom paraquedista que sou. E, saltando, ir de braços abertos, esticados, sem medo. Mais e mais o azul do céu, refletido, me chama. Como um marinheiro seduzido pelo canto das sereias. Forçado, ainda que de bom grado, a obedecer ao chamado. Mergulhando assim, de cabeça, sem se preocupar com eventuais perigos. Sem hesitar...

... e, no entanto, hesito. Não salto, não solto, não vou. Não me permito ir. Não por vontade própria, afinal minha vontade já foi há muito suplantada. Não por algum medo qualquer, afinal o que inebria meus sentidos já se encarregou de me fazer ignorá-lo. Não por vontade de outrem, afinal estou só, completa e totalmente só. Por mais incrível que possa parecer.

Indeciso, sento-me à beira do penhasco. Acima, o céu azul. Abaixo, o céu azul. Fecho meus olhos, respiro cada vez mais fundo, cada vez mais compassadamente. Uma calma e tranqüila música invade minha mente, e permito que ela devaneie.

Súbito, a dor! Pontadas, apertos, dores. As cicatrizes reaparecem, incham, inflamam. Como que tentando me fazer lembrar. Como que tentando me avisar. E bem lá no fundo, dos recônditos de minha mente, ouço as vozes me avisando para, dessa vez, ir devagar. Não tenha pressa, não se desespere, tenha paciência. Cada coisa a seu tempo, cada ato e cada cena devida e corretamente encenada.

Paciência!

Atiro então uma pequena pedra na água. Lentamente o desenho se desfaz. E o céu, antes liso e limpo, agora ondulado e distorcido. Respiro fundo. De novo. Mais uma vez. Novamente. Calma e tranquilamente desço do penhasco. Lenta e equilibradamente, pé ante pé, adentro a água. Lago profundo? Espelho d’água? Aos poucos, com a calma e da maneira correta, irei descobrir. Curtindo cada passo, cada conquista, cada sorriso.

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