terça-feira, 15 de novembro de 2011

Mais uma dose

http://www.youtube.com/watch?v=iOOvJY42k8w
(Toots Tilleman)





Mais uma dose. Ele olha o relógio, mas na verdade não consegue ver as horas. Também, o que importa saber a posição dos ponteiros? Que diferença fará saber até que ponto sua insônia chegou? Lá fora apenas o escuro da madrugada. E lá dentro, tal qual um espelho quebrado, apenas o absoluto silencioso breu refletido.


Mais uma dose. Merda, acabou o gelo! Sem problemas, até que puro não fica assim tão ruim. Também pudera, depois de tomar meia garrafa com gelo acho que ele já nem se importa mais. Realmente foi uma sorte ainda ter aquela garrafa de Red guardada. Foi a última do trio Red, Black e Jose. Foi a sobrevivente de uma viagem muito doida, a viagem que deveria ser apenas para descansar e tomar um banho de cultura mas que acabou se tornando uma “viagem” de viagem.

Mais uma dose. Através da janela a leitosa luz da lua minguante permeia o quarto. Sorrindo, ele estica a mão e busca por ela. Ah, quantos e quantos meses desde o seu último “encontro”? Ávido, ele a segura em suas mãos. Sente sua textura, com a ponta de seus dedos percorre o desenho de suas curvas. Parece senti-la estremecer. Ou seria ele? Trêmulo, umedece os lábios e a aproxima. É, mesmo depois de muito tempo o som flui de dentro dele. De olhos fechados ele apenas limpa a mente, deixando que seu entorpecido ser se expresse por si só.

Um doce e suave som invade a madrugada. Um som triste, algo melancólico, porém forte. Uma a uma as notas saem, soltas enfim, livres. Sozinhas, no começo. Fundidas depois de um tempo. E elas jorram, jorram, jorram. Enfim livres, enfim ar puro, enfim a fiel expressão do que está lá dentro. Raiva, angústia, melancolia, tristeza, alegria, saudade, solidão.

Lágrimas se juntam às notas e umedecem seus lábios. Elas também, enfim livres, enfim ar puro. Aos poucos todas se exaurem. E um aconchegante silêncio preenche.

Mais uma dose. A última, a saidera. Amarga como todo malte. Queimando como sempre. E por fim, o breu, o silêncio, a paz.

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