segunda-feira, 28 de novembro de 2011

A primeira vez


http://www.youtube.com/watch?v=oXenCC2jFg0
("O Filho que eu quero ter" - Toquinho e Vinícius)





(Post de Abril/2011)

Hoje foi a minha primeira vez. A primeiríssima vez. A inaugural, aquela para a qual estamos sempre teoricamente preparados. Aquela para a qual nunca estamos, de fato, prontos a encarar. E não vou negar, a primeira vez foi mesmo esquisita. Tive momentos de tensão, momentos de desânimo, momentos de riso e momentos de nada.


Essa tarde eu passei horas deliciosas com minha princesinha. E também passei horas super tensas. De fato são coisas para as quais eu pensei que estivesse preparado, mas vi que nunca se está devidamente pronto até que passemos efetivamente por essas situações. Queria que fosse a primeira e a última, mas sei que muitas outras situações como essa virão pela frente.

Estávamos brincando no cafofo, pulando na cama e rindo muito. Então ela me pediu pra irmos ao parquinho que fica aqui no condomínio. Sempre que ela quer ir acontece alguma coisa que não nos deixa ir. Dessa vez, depois de descermos a escada contado animadamente TODOS os degraus (uma divertida e gostosa brincadeira que descobri sem querer), percebi que tinha começado a chover. Uma baita sacanagem. Foi chegarmos no térreo que começaram as primeiras gotas. Um ar decepcionado e um sorriso desaparecendo de um lindo rostinho angelical. Uma pontada em meu coração.

Sobe as escadas de novo, e de novo contamos TODOS os degraus. Chegando no cafofo, ela me pediu pra olhar pela janela. E viu que a chuva tinha passado. Sem chuva aquele lindo rostinho se iluminou de novo, o sorriso se abriu mais uma vez e veio a pergunta, inevitável e esperançosa: “pai, vamos no parquinho?”. Como negar? Desce, conta de novo TODOS os degraus. E lá vamos nós, rumo ao parquinho. Uma pequena descida e alguns degraus. E mais diversão na escada. Desce e sobe, sobe e desce. Segura no corrimão, pula nos degraus. E pede a minha ajuda pra descer.

E foi aí que tudo começou. Eu sempre brinco com ela da mesma forma. Seguro seu braço esquerdo com a minha mão direita e ela pula os degraus, ficando dependurada. Pulamos o primeiro pedaço, sem problemas. Pulamos o segundo, risadas e gritinho de felicidade. Pulamos o terceiro e... algo errado. Senti, mais do que ouvi, um barulho estranho vindo do braço dela. E ao colocá-la no chão, vi que seus olhos se encheram de lágrimas. Gelei. Peguei-a no colo e subi correndo, buscando colocar gelo. Pedi que mexesse a mão e vi que não tinha nada quebrado. Deitei-a na cama, coloquei o pacote de ervilhas congeladas (é duro não ter gelo em casa...) em seu braço e esperei. Ela segurava o braço esquerdo com a mão direita, tentava não fazer caretas nem chorar. “Pai, já não ta mais doendo. Vamos no parquinho?”. Me cortou o coração. Quando fui ajeitá-la melhor na cama, ela começou a chorar. Vi que estava doendo e logo pensei em luxação ou algo semelhante.

Carol no colo, pacote de ervilhas no braço. Corre para o carro, ajeita a guria (que a essa altura do campeonato estava chorando a plenos pulmões) na cadeirinha e toca para o hospital. Mentalmente percorro uma lista de hospitais pediátricos que podem estar abertos e que atendam ao meu convênio. Quando acelero um pouco mais, ouço um “pai, vai devagar. Cuidado com os carros e as motos”. Eita orgulho do papai...

Chegando perto de um dos hospitais, percebo que ela dormiu. Desço correndo sem acordá-la e vou até a recepção. Em meio à sala lotada de crianças chorando sou informado que, infelizmente, não há ortopedistas de plantão. Corro de volta para o carro e percebo o celular vibrando. Era a mãe da Carol ligando (maldita ligação mãe e filhos, parece que adivinha! rs). Não atendi nem retornei na hora, sabia que não havia nada que ela pudesse fazer.

Chegando a outro hospital já entrei com ela em meus braços, chorando. Médicos, enfermeiras, atendentes. Todos me olharam ao mesmo tempo. E eu, com a maior calma do mundo, expliquei que ela tinha torcido o braço e que precisava de uma cama. Quarto providenciado, Carol na maca. CINCO enfermeiras entrando ao mesmo tempo! E minha princesinha aos berros. Acho que sou mesmo muito sangue frio, porque nem por um momento fiquei desesperado ou agitado.

“Senhor, preciso da carteirinha dela”. Eu já tinha pensado nisso, mas a carteirinha dela fica com a mãe. E a médica disse que iria precisar pois talvez fosse necessário tirar um raio X. Liguei pra mãe da Carol, com ela aos prantos do meu lado, e pedi que fosse levar a carteirinha. Não queria ter ligado porque sabia que ela iria ficar desesperada e já pensaria no pior. Mas, o que não tem remédio, remediado está.

Uma dose de dipirona via injeção. E mais choro, dessa vez porque o bumbum estava doendo. Agora era o braço e o bumbum. Dez, quinze, vinte minutos. E eu ali, fazendo carinho e conversando com ela. “Pai, quero mamá (suco)”. Então espera um pouco filha, o pai vai no carro buscar. Chamei uma enfermeira pra ficar com ela e fui buscar o suco. Chegando no carro lembrei que a água e o suco tinham ficado no meu apartamento. Peguei uma garrafa de água que tinha deixado no carro e voltei para o quarto. Chegando lá, surpresa! A Carol estava sentada, sorrindo e brincando com duas enfermeiras. Elas tinham enchido uma luva de ar e tinham desenhado olhos e boca nela, dizendo que era o pica-pau. Ah, como foi bom ver aquele rostinho todo sorridente de novo.

Chamaram a médica. Olha daqui, examina dali, mexe acolá. Nada de dor, nada de nada. Olho para a médica e ela apenas me diz que não vai mais submeter a minha filha a raio X. Desnecessário expô-la à radiação. Aliviado, agradeço.

Final da história? Carol toda serelepe, brincando e rindo com a médica e as enfermeiras. Até que chegam a mãe, a avó, a tia e o cunhado. Todos sem entender nada. Afinal a Carol estava rindo e brincando, sem nenhum traço de choro restando. Saímos todos do hospital, ela me dá um tchau meio tristonho (tenho certeza de que ainda queria ir no parquinho) e vamos cada um para o seu canto.

Ser pai não é fácil. Ser pai separado também não. Mas a gente aprende, a vida nos ensina. Pena que algumas vezes seja tão dolorido.


PS – Pensei que não tivesse ficado muito tenso, mas acordei no dia seguinte com muitas dores no braço e nas costas. Acho que fiquei tão tenso que acabei dando um mau jeito.

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