("Eu queria ter uma bomba" - Cazuza)
"Descobri que não sou amarelo. Descobri que sou azul. Talvez
por isso eu goste do verde, afinal o verde nada mais é do que a soma do amarelo
com o azul. Amarelo que eu pensei que fosse e o azul que não sabia que era. " (Eu mesmo, 03/08/2010)
No início era tudo meio
escondido, quase que envergonhado. Ela chegava devagar, esgueirando-se
sorrateira pelas beiradas de minha mente. Vinha aos poucos, milímetro a
milímetro, pé ante pé, sinuosa. Era mesmo engraçado, como se esperasse que eu
me acostumasse com sua presença. Chegava, ficava, aos poucos se instalava.
Montava sua morada, barraca, presença, tralhas. E, quando eu menos esperava, se
fazia dona e senhora do castelo.
No começo eu nem sentia, sequer
percebia. Não dava importância, pensava ser apenas algo passageiro. Fechava as
portas, virava as costas, ignorava. Sem, no entanto, expeli-la. Deixei que
ficasse, que criasse raízes, que se abancasse. Mesmo quando pensava tê-la
expulsado, de fato não o fazia. Sempre, e cada vez mais, um pedaço, uma parte
ficava e fincava cada vez mais profundas raízes.
A princípio tudo era
tranquilidade. Uma cócega inocente, um aperto qualquer, uma vontade que se ia.
Uma névoa que surgia mas logo se dissipava. Se dissipava...
Hoje, já sem cerimônia, ela chega
de supetão. Como quem já é de fato a dona do pedaço. Escancara portas, derruba
defesas, oblitera vontades. Traz com ela não mais uma leve névoa. Traz um
espesso nevoeiro, e com ele cobre todo e qualquer raio de luz que tente entrar.
Paralisante, amarra minhas vontades e desejos. Dominadora, expulsa o ânimo e
manda para longe a iniciativa. Tudo varre, deixando apenas um fiapo de
sanidade.
Azul. Azul da cor do mar, como
dizia a música? Azul de Metileno, como antigamente? Não... azul de blue...
Como uma velha companheira,
odiada, rejeitada mas ainda assim sempre presente, ela já se instalou em mim.
Já se fez presente, já se fez necessária, já se fez indispensável. Já se fez...
parte de mim.
Agora, para o bem ou para o mal,
somos um só. Não unha e carne. Não mais uma dupla. Não. Somos um só. Um só
corpo, um só sentimento, um só pensamento. Entranhada em meu ser, enraizada em
meus sentimentos ela agora é parte de mim. Uma parte indesejada, uma parte
instável. Uma parte indispensável.
“Bom dia, tristeza
Que tarde, tristeza
Você veio hoje me ver
Já estava ficando
Até meio triste
De estar tanto tempo
Longe de você
Se chegue, tristeza
Se sente comigo
Aqui, nesta mesa de bar
Beba do meu copo”
Azul, Blue. Tristeza, Melancolia.
Ah, minha boa e velha (e inseparável) companheira. Você não perdeu seu toque.
Continua com seu jeito paralisante, com seus longos dedos sufocantes e
tolhedores. Leve-me para as suas profundezas, leve-me com você. Leve-me para
onde apenas o silêncio e a dormência me façam companhia.
Porque hoje vou me permitir
hibernar.
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